A complexidade do câncer, destrinchada em números e algoritmos
Recursos de inteligência artificial e big data ajudam os profissionais a lidar com uma doença repleta de variáveis – e até a melhorar a gestão do cuidado na Oncologia

Uma cultura organizacional baseada em dados, como a desenvolvida no Einstein, será cada vez mais relevante para lidar com uma doença tão complexa quanto o câncer, que gera muitas informações, mas ao mesmo tempo depende de outras muitas informações para um bom cuidado.
“A velocidade de atualização de protocolos na Oncologia é altíssima. Dessa forma, medir a adesão dos tratamentos a diretrizes clínicas requer um processo de atualização constante destes protocolos”, argumenta Vanessa Teich, diretora de Transformação da Oncologia e Hematologia. “O que queremos no Einstein é usar a inteligência artificial para ajudar os profissionais de saúde a navegar nesse universo de dados e oferecer aos pacientes a melhor jornada de cuidado, aderente aos tratamentos mais modernos e eficazes disponíveis”, completa.
Essa busca, alinhada com o desenvolvimento de inteligências artificiais cada vez mais refinadas, já começa a render frutos. Na gestão de pacientes oncológicos do Hospital Municipal Vila Santa Catarina – Dr. Gilson de Cássia Marques de Carvalho, um hospital público administrado pelo Einstein, enfermeiros navegadores – profissionais que ajudam os pacientes com diferentes questões do cotidiano, como marcações de consultas e de exames – agora recebem apoio de um software criado internamente para otimizar as agendas e, com isso, aumentar a eficiência do hospital.
“Após duas tentativas, em 2023 conseguimos criar um programa que, antes de tudo, captura e organiza dados de diferentes pontos do atendimento de um paciente com câncer”, conta o pediatra Luis Felipe Batista Hiar, um dos idealizadores do projeto e consultor de analytics em assistência médica do Einstein.
Isso não é trivial: da chegada à saída do hospital, um paciente fornece diferentes dados, que são armazenados em múltiplos locais. Há os registros na recepção (nome, idade, sexo, horário de chegada…); os do prontuário médico (CID da doença, estadiamento, tratamentos…); os de exames (resultados, laudos, agendamentos…) e por aí vai. São dezenas de variáveis em plataformas distintas, e que podem ser preenchidas de um jeito despadronizado. “O nosso software usa algoritmos para organizar isso em um mesmo local”, relata Hiar.
Com base nesse programa, o enfermeiro navegador entende a jornada de cada paciente com mais facilidade – em vez de caçar informações em diferentes bases, ele enxerga tudo de forma consolidada. A partir daí, sabe o que o médico pediu, quais exames estão faltando, quais consultas foram agendadas. “Aí ele ajusta as agendas para que, por exemplo, um paciente faça um exame necessário a tempo para a próxima consulta, o que evita cancelamentos, idas desnecessárias ao hospital e atrasos no tratamento”, completa Hiar.
Graças a iniciativas como essa, o Vila Santa Catarina abreviou consideravelmente o tempo entre o diagnóstico e o início da terapia. E a ideia é evoluir ainda mais nessa linha.
O software que organiza os dados de atendimento do Hospital Municipal Vila Santa Catarina está sendo testado em outras unidades do Einstein, e pode virar futuramente um produto a ser comercializado.
A inteligência artificial também começa a ser usada para apoiar a análise de exames. “Já possuímos um algoritmo rodando no pronto-socorro que procura alterações em exames de raio-x”, revela Gilberto Szarf, gerente médico de Radiologia do Einstein. O programa serve de suporte ao médico para identificar quadros que podem passar batido, como uma pneumonia em estágio inicial ou até um nódulo suspeito.
Os exames realizados na Oncologia, aliás, alimentam uma base de dados interna capaz de ser empregada para aprimorar o atendimento, para fins de pesquisa e como forma de treinar novos algoritmos, entre outras utilidades. É realmente uma cultura de dados.
No futuro, espera-se que o médico possa ter o apoio dessas tecnologias para não precisar ficar anotando o que o paciente relata (um programa captaria e organizaria de forma intuitiva o que é dito na consulta e, quem sabe, sugeriria questões a serem feitas). Isso daria mais tempo ao profissional para atender o paciente – eventualmente, com apoio de um programa de inteligência artificial que indicaria terapias com maior eficácia para aquele caso, com base em uma varredura da literatura científica.
“Há muitos dados disponíveis e outros tantos que são gerados em um hospital como o Einstein. O que pretendemos é usar a inteligência artificial para utilizar estes dados, de forma a oferecer o melhor cuidado e os melhores desfechos possíveis aos pacientes”, conclui Vanessa Teich.